Untitled

Apoio matricial e equipe de referência: uma metodologia para gestão do trabalho interdisciplinar em saúde Matrix support and reference team: a methodology for the interdisciplinary in health work management Gastão Wagner de Sousa Campos 1Ana Carla Domitti 1 The authors discuss a theoretical and concep- Os conceitos de apoio matricial e equipe de re- tual management methodology based on refer- ferência foram propostos por Campos 1 dentro Estadual de Campinas, Campinas, Brasil. ence teams and matrix support. Reference team da linha de pesquisa voltada para a reforma das is a structural organization that intents to put organizações e do trabalho em saúde. Posterior- together the management power and the inter- mente, essa metodologia de gestão do cuidado foi G. W. S. CamposDepartamento de Medicina disciplinary work. Matrix support change the adotada em serviços de saúde mental 2, de aten- way traditional health systems works, the spe- ção básica e da área hospitalar do Sistema Único cialist is organically integrate to other teams de Saúde (SUS) de Campinas 3. Algum tempo de- Médicas, Universidade Estadual de Campinas. who needs help. Besides care support, there is pois, alguns programas do Ministério da Saúde another goal: to build new knowledge on each – Humaniza-SUS 4, Saúde Mental 5 e Atenção Bá- Vaz, C. P. 6111, Campinas, SP 13084-971, Brasil. professional in a process of permanent educa- sica/Saúde da Família 6 – também incorporaram tion. Structural, politics, cultural, theoretical essa perspectiva. Este trabalho objetiva descre- and subjective obstacles against this new model ver esses dois arranjos organizacionais, indicar conceitos e teorias sobre os quais se apóiam essa metodologia de trabalho, bem como identificar obstáculos epistemológicos e da estrutura dos serviços que essa alternativa propõe-se a enfren-tar. Tal estudo servirá de elemento de base para apoiar pesquisas que avaliem limitações e potên-cia dessa modalidade organizacional.
O que é e como funcionam o apoiomatricial e a equipe de referência O apoio matricial em saúde objetiva assegurar retaguarda especializada a equipes e profissio-nais encarregados da atenção a problemas de saúde. Trata-se de uma metodologia de trabalho complementar àquela prevista em sistemas hie- Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 22(X):1547-1555, xxx, 2006 rarquizados, a saber: mecanismos de referência e Procura fazer coincidir a unidade de gestão que contra-referência, protocolos e centros de regu- compõe as organizações de saúde com a unidade lação. O apoio matricial pretende oferecer tanto de produção interdisciplinar. No caso, a menor retaguarda assistencial quanto suporte técnico- unidade organizacional passaria a ser a equipe pedagógico às equipes de referência. Depende de referência. A equipe de referência é composta da construção compartilhada de diretrizes clí- por um conjunto de profissionais considerados nicas e sanitárias entre os componentes de uma essenciais para a condução de problemas de equipe de referência e os especialistas que ofe- saúde dentro de certo campo de conhecimen- recem apoio matricial. Essas diretrizes devem to. Dentro dessa lógica, a equipe de referência é prever critérios para acionar o apoio e definir o composta por distintos especialistas e profissio- espectro de responsabilidade tanto dos diferen- nais encarregados de intervir sobre um mesmo tes integrantes da equipe de referência quanto objeto – problema de saúde –, buscando atingir objetivos comuns e sendo responsáveis pela re- A equipe ou profissional de referência são alização de um conjunto de tarefas, ainda que aqueles que têm a responsabilidade pela con- operando com diversos modos de intervenção. O dução de um caso individual, familiar ou comu- máximo de poder delegado à equipe interdisci- nitário. Objetiva ampliar as possibilidades de plinar. Não todo o poder, porque há o poder dos construção de vínculo entre profissionais e usuá- gestores e usuários, necessários para o cumpri- rios 7. O termo responsabilidade de condução re- mento da função de coordenação, de integração fere-se à tarefa de encarregar-se da atenção ao e de avaliação do trabalho das distintas equipes longo do tempo, ou seja, de maneira longitudinal, de referência. Em organizações maiores, faz-se à semelhança do preconizado para equipes de necessário a agregação de equipes de referên- saúde da família na atenção básica 8. O conceito cia em departamentos estruturados dentro da de equipe de referência pressupõe a adoção de mesma lógica: as unidades de produção seriam lógica análoga para profissionais que trabalhem a agregação de um conjunto de equipes de refe- em policlínicas ou hospitais, como é o caso de te- rência e de apoiadores matriciais que comparti- rapeutas ocupacionais, psiquiatras e psicólogos lhem de um mesmo campo de intervenção.
que trabalham em centros de apoio psicossocial; A gestão do trabalho interdisciplinar em de infectologistas, enfermeiros e assistentes so- equipes de referência depende de uma série de ciais no programa de DST/AIDS; de ortopedistas, instrumentos operacionais. Para que ocorra cla- cirurgiões e enfermeiros em departamentos de ra definição da responsabilidade sanitária e se ampliem as possibilidades de construção de vín- Apoio matricial e equipe de referência são, culo, é fundamental valer-se da metodologia de ao mesmo tempo, arranjos organizacionais e adscrição de clientela à equipe de referência. No uma metodologia para a gestão do trabalho em caso, cada equipe de referência terá um registro saúde, objetivando ampliar as possibilidades de e um cadastro de casos sob sua responsabilidade. realizar-se clínica ampliada e integração dialógi- O manejo desse cadastro permitirá avaliação de ca entre distintas especialidades e profissões. A risco e vulnerabilidade, identificando-se aqueles composição da equipe de referência e a criação casos que mereceriam a elaboração de um pro- de especialidades em apoio matricial buscam jeto terapêutico singular, ou mesmo alteração da criar possibilidades para operar-se com uma am- avaliação diagnóstica ou dos procedimentos de pliação do trabalho clínico e do sanitário, já que se considera que nenhum especialista, de modo A equipe de referência manterá uma relação isolado, poderá assegurar uma abordagem inte- longitudinal no tempo com esse conjunto de gral. Essa metodologia pretende assegurar maior usuários, para isso é fundamental que a inser- eficácia e eficiência ao trabalho em saúde, mas ção dos profissionais no serviço dê-se de modo também investir na construção de autonomia horizontal, contratação como diaristas. A inser- dos usuários. Sua utilização como instrumento ção vertical justificar-se-ia somente para aqueles concreto e cotidiano pressupõe certo grau de re- profissionais em regime de plantão. Com essa forma ou de transformação do modo como se metodologia, a equipe de referência permanece organizam e funcionam serviços e sistemas de responsável pela condução dos casos inscritos saúde. Isso indica a existência de dificuldades e em seu cadastro, mesmo quando algum tipo de obstáculos para a reorganização do trabalho em apoio especializado foi acionado. Como a pro- posta de equipes de referência é extensiva aos A equipe de referência é um rearranjo orga- hospitais, centros de referência, enfermarias, nizacional que busca deslocar o poder das pro- unidades de urgência ou de terapia intensiva, fissões e corporações de especialistas, reforçan- fica evidente que a adscrição de clientela em do o poder de gestão da equipe interdisciplinar. cada um desses casos terá uma temporalidade Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 22(X):1547-1555, xxx, 2006 METODOLOGIA PARA GESTÃO DO TRABALHO INTERDISCIPLINAR EM SAÚDE distinta daquela das equipes de saúde da família, apoio matricial, de preferência por meios diretos em geral, mais longa. Um paciente em tratamen- de comunicação personalizados, contato pes- to de AIDS deveria permanecer adscrito a uma soal, eletrônico ou telefônico e não apenas por equipe de referência de um centro especializado meio de encaminhamento impresso entregue ao enquanto persistir seu problema; um outro em paciente, solicitando-se algum tipo de interven- uma enfermaria permanecerá referido a deter- ção ao apoiador. Nessas circunstâncias, é reco- minada equipe enquanto durar seu tratamento mendável proceder-se a uma avaliação de risco para se acordar uma agenda possível.
O funcionamento dialógico e integrado da O apoio matricial implica sempre a constru- equipe de referência pressupõe tomá-la como ção de um projeto terapêutico integrado, no en- um espaço coletivo, que discute casos clínicos, tanto essa articulação entre equipe de referência sanitários ou de gestão, e participa da vida da e apoiadores pode desenvolver-se em três planos O apoiador matricial é um especialista que a) atendimentos e intervenções conjuntas entre
tem um núcleo de conhecimento e um perfil o especialista matricial e alguns profissionais da distinto daquele dos profissionais de referência, mas que pode agregar recursos de saber e mesmo b) em situações que exijam atenção específica
contribuir com intervenções que aumentem a ao núcleo de saber do apoiador, este pode pro- capacidade de resolver problemas de saúde da gramar para si mesmo uma série de atendimen- equipe primariamente responsável pelo caso. O tos ou de intervenções especializadas, manten- apoio matricial procura construir e ativar espaço do contato com a equipe de referência, que não para comunicação ativa e para o compartilha- se descomprometeria com o caso, ao contrário, mento de conhecimento entre profissionais de procuraria redefinir um padrão de seguimento complementar e compatível ao cuidado ofereci- O apoio matricial busca personalizar os siste- do pelo apoiador diretamente ao paciente, ou à mas de referência e contra-referência, ao estimu- lar e facilitar o contato direto entre referência en- c) é possível ainda que o apoio restrinja-se à
carregada do caso e especialista de apoio. Nesse troca de conhecimento e de orientações entre sentido, essa metodologia altera o papel das Cen- equipe e apoiador; diálogo sobre alterações na trais de Regulação, reservando-lhe uma função avaliação do caso e mesmo reorientação de con- na urgência, no zelo pelas normas e protocolos dutas antes adotadas, permanecendo, contudo, o acordados e na divulgação do apoio disponível. caso sob cuidado da equipe de referência.
A decisão sobre o acesso de um caso a um apoio Essa dinâmica presta-se tanto para ordenar especializado seria, em última instância, tomada a relação entre os níveis hierárquicos do sistema de maneira interativa, entre profissional de refe- quanto para facilitar a comunicação e integração rência e apoiador. O regulador à distância teria de equipes de saúde da família e especialistas, ou um papel de acompanhar e avaliar a pertinência mesmo entre distintas especialidades e profis- dessas decisões e de tomá-las somente em situa- sões de saúde que trabalhem em um mesmo ser- ções de urgência, quando não haveria tempo pa- viço, hospital ou centro de referência. Em Cam- ra o estabelecimento de contato entre referência pinas, São Paulo, Brasil, foram criados Núcleos de Saúde Coletiva na atenção básica, que deve- Há duas maneiras básicas para o estabeleci- riam fornecer apoio matricial em saúde pública mento desse contato entre referências e apoia- (vigilância, promoção, projetos de intervenção dores. Primeiro, mediante a combinação de en- comunitários ou intersetoriais, avaliação e pla- contros periódicos e regulares – a cada semana, nejamento de programas etc.) para as equipes de quinzena ou mais espaçados – entre equipe de re- saúde da família. Organizou-se também apoio ferência e apoiador matricial. Nesses encontros, em áreas clínicas como, saúde mental, nutrição e objetiva-se discutir casos ou problemas de saúde selecionados pela equipe de referência e procu- O termo apoio matricial é composto por dois ra-se elaborar projetos terapêuticos e acordar li- conceitos operadores. O segundo deles – matri- nhas de intervenção para os vários profissionais cial – indica uma mudança radical de posição envolvidos. Recomenda-se reservar algum tem- do especialista em relação ao profissional que po para diálogo sobre temas clínicos, de saúde demanda seu apoio. Na teoria de sistemas de coletiva ou de gestão do sistema. Segundo, além saúde, há o princípio da hierarquização 10, em desses encontros, em casos imprevistos e urgen- que se prevê uma diferença de autoridade entre tes, em que não seria recomendável aguardar a quem encaminha um caso e quem o recebe; o reunião regular, como na lógica dos sistemas hie- nível primário dirige-se ao secundário e assim rarquizados, o profissional de referência aciona o sucessivamente, havendo ainda uma transferên- Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 22(X):1547-1555, xxx, 2006 cia de responsabilidade quando do encaminha- outro também em função de seu conhecimento, mento. Tratar-se-ia de relações do tipo vertical, desejo, interesses e visão de mundo.
em que a comunicação entre os níveis ocorre por Procura-se criar espaços coletivos protegidos meio de informes escritos – no caso, a planilha que permitam a interação dessas diferenças, bus- de referência –, apenas para transferir uma res- cando-se construir uma análise e uma interpre- ponsabilidade e receber algum informe ao final tação sintética, bem como se acordando linhas do procedimento – o formulário de contra-refe- de intervenção e distribuição de tarefas entre os rência. Esse estilo de relação entre trabalhadores vários sujeitos envolvidos no processo.
foi concebido pela administração clássica, indu-zindo sistemas burocráticos e pouco dinâmicos. Ao criticar esse modelo de gestão do trabalho, alguns teóricos sugeriram pensar-se as organi-zações como uma matriz 11, em que a inevitável Há obstáculos na própria maneira como as or- departamentalização, que estipula uma linha de ganizações vêm se estruturando, que conspiram comando e de gestão vertical, induzindo uma contra esse modo interdisciplinar e dialógico de fragmentação do processo de trabalho, pode- operar-se. Esses obstáculos precisam ser conhe- ria ter seus efeitos atenuados se fossem criadas cidos, analisados e, quando possível, removidos ações horizontais que atingissem vários desses ou enfraquecidos para que seja possível traba- departamentos. Pensavam em projetos, comis- lhar-se com base em equipe interdisciplinar e sões ou supervisores que atuassem de maneira horizontal, em vários departamentos, mas sem O apoio matricial e a equipe de referência são autoridade gerencial sobre as pessoas que cons- metodologias de trabalho, modo para se realizar a gestão da atenção em saúde, mas são, ao mes- O termo matriz carrega vários sentidos; por mo tempo, arranjos organizacionais que buscam um lado, em sua origem latina, significa o lugar diminuir a fragmentação imposta ao processo onde se geram e se criam coisas; por outro, foi de trabalho decorrente da especialização cres- utilizado para indicar um conjunto de núme- cente em quase todas as áreas de conhecimento. ros que guardam relação entre si quer os ana- Para que a interdisciplinaridade ocorra de fato lisemos na vertical, na horizontal ou em linhas e contribua para aumentar a eficácia das inter- transversais 12. Pois bem, o emprego desse no- venções, é importante não somente se facilitar a me – matricial – indica essa possibilidade, a de comunicação entre distintos especialistas e pro- sugerir que profissionais de referência e espe- fissionais 15, como também montar um sistema cialistas mantenham uma relação horizontal, e que produza um compartilhamento sincrônico não apenas vertical como recomenda a tradição e diacrônico de responsabilidades pelos casos e dos sistemas de saúde. Trata-se de uma tentativa pela ação prática e sistemática conforme cada de atenuar a rigidez dos sistemas de saúde quan- projeto terapêutico específico. O papel de cada do planejados de maneira muito estrita segun- instância, de cada profissional, deve ficar bem do as diretrizes clássicas de hierarquização e re- claro. Alguém deve se responsabilizar pelo se- guimento longitudinal e pela construção de uma O primeiro termo – apoio – sugere uma ma- lógica que procure integrar a contribuição dos neira para operar-se essa relação horizontal me- vários serviços, departamentos e profissionais. diante a construção de várias linhas de transver- Em geral, esse papel cabe a integrantes da equipe salidade, ou seja, sugere uma metodologia para de referência. Com certeza, não é essa a tradição ordenar essa relação entre referência e especia- de funcionamento dos serviços de saúde.
lista não mais com base na autoridade, mas com Em Medicina e na saúde em geral houve uma base em procedimentos dialógicos. O termo foi crescente divisão do trabalho que dificulta a inte- retirado do método Paidéia 14, que cria a figura gração do processo de atenção e cuidado às pes- do apoiador institucional e sugere que tanto na soas, já que as distintas especialidades médicas gestão do trabalho em equipe quanto na clínica, e profissões de saúde definiram objetos de inter- na saúde pública ou nos processos pedagógicos, venção e campos de conhecimento sem grandes a relação entre sujeitos com saberes, valores e compromissos com a abordagem integral de pro- papéis distintos pode ocorrer de maneira dialó- cessos saúde e doença concretos 16.
gica. No caso, o apoiador procura construir de Em decorrência dessa realidade vieram se maneira compartilhada com os outros interlocu- estruturando organizações de saúde com eleva- tores projetos de intervenção, valendo-se tanto do grau de departamentalização. Analisando a de ofertas originárias de seu núcleo de conhe- estrutura de duas organizações prototípicas da cimento, de sua experiência e visão de mundo, área da saúde – o hospital e o ambulatório – ve- quanto incorporando demandas trazidas pelo rificamos que elas, em geral, dividem-se em de- Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 22(X):1547-1555, xxx, 2006 METODOLOGIA PARA GESTÃO DO TRABALHO INTERDISCIPLINAR EM SAÚDE partamentos ordenados segundo lógica das pro- chefe de enfermagem; outro comanda os psicó- fissões e especialidades médicas 17. Estudiosos logos, outro os fisioterapeutas, outro a assistente da administração têm identificado várias racio- social; a disciplina, regras para visitas, a limpeza nalidades que vêm sendo empregadas para divi- e suprimento serão comandados por um outro dir responsabilidades em organizações contem- chefe da área administrativa; e caso haja ainda porâneas. Há organizações com departamentos casos clínicos complicados, o médico internista ordenados segundo produtos – tipos de bens ou terá ainda um décimo diretor diferente.
serviços produzidos –, outras de acordo com eta- Esse tipo de estrutura também contribui para pas do processo de trabalho ou ainda com a fun- diluir a responsabilidade sanitária sob os casos ção de cada área da empresa, outras se dividem acompanhados. Há uma dupla fragmentação, segundo a clientela a ser atendida, há também do processo de trabalho e da unidade de gestão, aquelas que se organizam segundo o território que dificulta a identificação clara do responsável clínico, bem como torna quase impossível a in- Pois bem, em hospitais, ambulatórios e ou- tegração comunicativa das abordagens diagnós- tros serviços de saúde tem predominado uma ticas e terapêuticas. Esse fenômeno está sendo lógica que leva ao extremo a fragmentação do denominado de obstáculo estrutural à prática de cuidado. Verifica-se na área da saúde que a cons- uma clínica ampliada, bem como do trabalho in- trução de unidades de gestão obedece antes de terdisciplinar. Valeria proceder-se maiores inves- tudo à lógica corporativa e das profissões. Esse tigações para esclarecer o peso que esse tipo de fato é marcante em áreas voltadas para a assis- obstáculo teria na tendência a custos crescentes, tência ao usuário, que se organizam em depar- perda de eficácia e aumento da iatrogenia verifi- tamentos, diretorias ou coordenações recortadas segundo profissão ou especialidade médica 19. Não é lógico, parece pouco racional, mas as- Em áreas-meio, em geral, observa-se uma agre- sim vem funcionando há décadas na maioria dos gação maior, identificando-se unidades de ges- serviços de saúde. Vem funcionando, porque a tão recortadas segundo funções: departamento administração sanitária tem se utilizado de vários de administração e finanças, lavanderia, nutri- instrumentos para atenuar os efeitos negativos ção e dietética, laboratório etc. 20. No entanto, desses obstáculos estruturais. Entre os recursos nos departamentos voltados diretamente para gerenciais que se contrapõem a essa tendência, a atenção ao usuário, encontra-se departamen- ressalta-se o papel integrador do corpo de enfer- to de enfermagem, de ortopedia, de psiquiatria, magem, que ainda que organizado de maneira infectologia etc. Nesses serviços, há uma com- vertical e paralela às demais profissões – daí ad- posição multiprofissional de pessoal, com baixo vém o conceito utilizado de “corpo” –, espalha-se grau de coordenação, comunicação e integração por todo o hospital, compensando, com seu zelo, entre as distintas especialidade e profissões. Até a extrema fragmentação imposta pela circulação mesmo o desenho arquitetônico da maioria dos vertiginosa de especialistas entre usuários 22. ambulatórios reflete essa lógica de ferro: uma Outros recursos freqüentemente adotados para sucessão de pequenas salas para consultório atenuar esse tipo de fragmentação são normas, ou procedimentos que, de tão desconectados, sistemas de acreditação e protocolos que pro- bem poderiam funcionar em espaços geográfi- curam padronizar condutas e definir fluxos por onde deveriam circular os pacientes 23.
Essa estrutura cria dificuldades gerenciais Essas tendências à descontinuidade e a frag- extremas e constitui-se em um obstáculo estru- mentação dos projetos terapêuticos acentuam- tural à adoção do método de trabalho de apoio se quando a intervenção depende de mais de matricial. Um mesmo espaço de trabalho, uma um serviço integrante do sistema de saúde. O enfermaria hospitalar, por exemplo, com res- recurso gerencial utilizado para conectar esses ponsabilidade sanitária, objetivos, métodos de pedaços são os sistemas de referência e contra- trabalho e funções, todos muito bem definidos; referência e os Centros de Regulação com seus quando a organização obedece a essa lógica de protocolos e regulamentações. Alguns sistemas departamentos corporativos, não se constitui em criam instâncias de decisão – gestão de caso – uma única unidade de gestão. Ao contrário, essa distanciadas do atendimento direto ao paciente: mesma enfermaria tende a ser comandada por, são os famosos reguladores a distância ou geren- no mínimo, meia dúzia de gerentes que não estão obrigados a se compor em colegiados ou a coor- Que potência teria a reestruturação das orga- denar e integrar seus planos de trabalho. Em uma nizações de saúde segundo equipes interdiscipli- mesma enfermaria destinada à Psiquiatria, por nares apoiadas por especialistas matriciais? Há exemplo, pode haver um comandante dos mé- evidências teóricas de que contribuiria bastante dicos especialistas, o psiquiatra chefe; há outro para melhor definir os padrões de responsabili- Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 22(X):1547-1555, xxx, 2006 dade sanitária, permitindo com isso o estabeleci- mento de programas com coeficiente de vínculo entre profissionais e usuários mais humanos e As organizações de saúde têm a tradição de fun- eficazes, além de criar espaço onde uma integra- cionar com concentração de poder: concentrado ção interdisciplinar seja possível, ainda que não nos diretores, nos médicos e nos especialistas. automática ou de simples execução.
O SUS introduziu a diretriz do controle social, no entanto a idéia de gestão compartilhada foca instâncias do sistema de saúde – conferências e conselhos em municípios, estados e união – e não necessariamente internas aos serviços ou programas 28. As criações de espaços coleti- A implantação do SUS é parcial. Há evidências vos, em que equipes de saúde compartilhem a indicando que o volume de serviços oferecidos elaboração de planos gerenciais e de projetos à população brasileira ainda é insuficiente 25. terapêuticos, depende ainda de uma ampla re- De qualquer modo, reconhece-se que esses re- formulação da mentalidade e da legislação do cursos poderiam ter um uso mais adequado e sistema de saúde. As políticas de humanização racional, caso ocorressem reordenações no mo- têm igualmente tentado ampliar o poder dos delo de gestão e de atenção 26. Ressalte-se, nesse usuários no cotidiano dos serviços de saúde. aspecto, o papel que a construção de uma rede Ressalta-se, nesse momento, que são tendências básica com ampla cobertura populacional e ca- ainda não consolidadas e que o apoio matricial e pacidade de resolver problemas tem tido na via- mesmo o funcionamento de equipes de referên- bilidade de sistemas nacionais de saúde 27. Entre cia dependem de um importante grau de com- outros arranjos, também o apoio matricial poder partilhamento do poder entre distintos profissio- ser relevante para racionalizar o acesso e o uso nais componentes de uma equipe e desses com de recursos especializados, alterando-se ainda a ordenação predominantemente multidisci- A circulação de informações, os contatos in- plinar do sistema para uma outra mais consen- terprofissionais e a preocupação em captar as tânea com a interdisciplinaridade. Esse arranjo várias dimensões do sujeito com problema de permite um uso racional de recursos, quando saúde têm dimensões bastante restritas no mo- cria oportunidade para que um único especia- delo tradicional de estruturação do poder em lista integre organicamente seu trabalho com o organizações de saúde. Não é fácil acordar-se de várias equipes de referência. Por exemplo: um sobre o que está ou não em discussão, ou seja, único clínico geral ou um fisioterapeuta poderia até onde vai o poder de influência, ou mesmo de assegurar apoio matricial a várias (quatro, cinco, deliberação conjunta, entre os distintos especia- seis?) equipes especializadas em trauma e com- listas. A equipe de referência e o apoio matricial posta por cirurgiões, ortopedistas e enfermeiros, diminuem o peso da influência “paterna” na so- contribuindo tanto para a avaliação conjunta do lução de conflitos, ou seja, as autoridades exter- estado clínico dos casos quanto para o contro- nas – chefes, leis e regras – são reinterpretadas le de infecções pós-cirúrgicas ou de outras in- na horizontalidade dos irmãos reunidos em uma tercorrências clínicas. Com esse tipo de relação, fratria 29. Por outro lado, há poucos serviços or- no decorrer do tempo, a equipe de trauma iria ganizados em sistemas de co-gestão, com equi- incorporando em seu campo de conhecimento pes e colegiados com poder de deliberação e com aspectos antes delegados aos clínicos ou fisio- sistemas interdepartamentais e interequipes de terapeutas, ampliando com isso sua capacidade de resolver problemas de saúde e indicando com Resumindo: o método do apoio matricial de- mais sensibilidade e precisão os casos que neces- pende da existência de espaços coletivos, ou seja, do estabelecimento de algum grau de co-gestão Como o apoio é dinâmico e depende de re- lações interpessoais, esses especialistas como que passariam a fazer parte dessa meia dezena de equipes de trauma, possibilitando, em tese, uma ampliação da visão sobre o processo saúde, doença, intervenção, sem que haja uma diluição O trabalho interdisciplinar depende também de da responsabilidade sobre os casos. Também certa predisposição subjetiva para se lidar com nesse aspecto esse obstáculo funciona como um a incerteza, para receber e fazer críticas e para empecilho para o apoio matricial, no entanto o tomada de decisão de modo compartilhado. É apoio matricial é, ao mesmo tempo, uma manei- mister reconhecer que não é esse o padrão de ra de reduzir a potência desse obstáculo.
subjetividade dominante em ambientes de con- Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 22(X):1547-1555, xxx, 2006 METODOLOGIA PARA GESTÃO DO TRABALHO INTERDISCIPLINAR EM SAÚDE corrência exacerbada, modo predominante de maneira precisa a responsabilidade sanitária, funcionamento das instituições contemporâne- ao mesmo tempo, complica-se o tema da pri- as 30. Nesses casos, as pessoas tendem a cristali- vacidade e do segredo sobre a história do pa- zar-se em identidades reativas, que as induzem ciente, da família ou de grupos comunitários. a desconfiar do outro e a defender-se de modo A utilização de prontuário único pela equipe paranóico da concorrência alheia. Por outro interdisciplinar, a discussão de casos em equi- lado, é comum o profissional construir identi- pe, toda essa circulação de informação, obriga dade e segurança, apegando-se à identidade de a todas as profissões de saúde a repensarem seu núcleo de especialidade, o que dificulta a o tema das relações entre eles e deles com os abertura para a interação inevitável em espaços usuários. Que aspectos de uma história colhida em um atendimento individual, um médico ou Nesses ambientes, a descoberta de problemas uma psicóloga ou um enfermeiro podem regis- ou de faltas costuma ser identificada à falha ou trar no prontuário ou comunicar aos demais erro e ser utilizada para luta política ou em defesa membros da equipe ou do apoio? Observação de interesses particulares 31. Não há cultura, en- que um agente de saúde recolhe durante uma tre gestores e entre equipes, sobre métodos para visita familiar, como e em que grau divulgá-la programar trabalho dialógico e interativo, crian- a outros colegas de equipe? Cada profissional do instâncias de mediação, espaços protegidos teria um registro particular e outro comparti- e processos de contrato em que se estabeleçam lhado com a equipe? Como lidar com o coletivo metas e critérios para avaliação do trabalho.
e com a circulação de informação, sem com- Os profissionais habituaram-se a valorizar prometer o direito à privacidade de cada caso a autonomia profissional, julgando-a conforme o direito que teriam de deliberar sobre casos de modo isolado e definitivo. O apoio matricial promove encontro entre distintas perspectivas, obrigando os profissionais a comporem projetos terapêuticos com outras racionalidades e visões A maioria das especialidades e profissões de de mundo. Note-se que, em casos de impasse, saúde trabalha com um referencial sobre o pro- e se o impasse se referir ao terapêutico, não há cesso saúde e doença restrito. Predominam os instâncias superiores para resolver o conflito. O filiados à racionalidade biomédica, o que os gerente em saúde, em geral, tem pequena capa- leva a pensar e a agir segundo essa perspectiva cidade de interferir sobre conduta específica do restrita 32. Outros tendentes a valorizar o social especialista, cabendo aos envolvidos no conflito na explicação desse fenômeno também geram encontrar uma saída que não prejudique o usuá- soluções restritas a essa linha de interven- rio nem paralise o projeto terapêutico.
ção 33. O mesmo se pode observar entre aque- O conceito de projeto terapêutico tem se les adeptos de explicação subjetiva (desejo ou mostrado útil para mediar esse tipo de relação. cognição) que pensam linhas de trabalho res- Trata-se de uma discussão prospectiva de caso, tritas a esses planos. O enfoque de clínica am- em que, depois de uma avaliação de risco e de pliada, ou clínica do sujeito, sugere maneiras vulnerabilidade compartilhada, são acordados para integrar essas perspectivas em um méto- procedimentos a cargo de diversos membros da do de trabalho que reconheça a complexidade equipe. Ainda que seja possível uma descrição e variabilidade dos fatores e dos recursos en- singela desse tipo de trabalho em grupo, não é volvidos em cada caso específico, seja ele um simples, no cotidiano, estabelecer-se esse tipo problema individual ou coletivo. Pois bem, no- de diálogo, com decisões e tarefas definidas de vamente o apoio matricial é um dispositivo im- portante para ampliação da clínica; ao mesmo tempo, para se trabalhar em uma perspectiva interdisciplinar, pressupõe-se algum grau de adesão a um paradigma que pense o proces-so saúde, doença e intervenção de modo mais Se o método de trabalho com base em equipe de referência e apoio matricial busca definir de Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 22(X):1547-1555, xxx, 2006 Os autores apresentam uma reconstrução teórico- Todos os autores participaram desde a revisão biblio- conceitual da metodologia de gestão do trabalho em gráfica e análise documental até a redação final do saúde baseada em equipes de referência e apoio ma- tricial. Equipe de referência é um rearranjo organiza-cional que procura coincidir o poder de gestão com a equipe interdisciplinar. O apoio matricial sugere mod-ificações entre as relações dos níveis hierárquicos em sistemas de saúde; nesse caso, o especialista integra-se organicamente a várias equipes que necessitam do seu trabalho especializado. Além da retaguarda assisten-cial, objetiva-se produzir um espaço em que ocorra intercâmbio sistemático de conhecimentos entre as várias especialidades e profissões. São apontados ob-stáculos estruturais, éticos, políticos, culturais, espiste-mológicos e subjetivos ao desenvolvimento desse tipo de trabalho integrado em saúde. 1. Campos GWS. Equipes de referência e apoio espe- 11. Motta FCP. Teoria geral da administração. São Pau- cializado matricial: uma proposta de reorganiza- lo: Editora Livraria Pioneira; 1987.
ção do trabalho em saúde. Ciênc Saúde Coletiva 12. Houaiss A, Villar MS. Dicionário da língua portu- guesa. Rio de Janeiro: Editora Objetiva; 2004.
2. Prefeitura de Campinas. Saúde mental: apoio ma- 13. Campos GWS. Sobre la reforma de los modelos de tricial ao Paidéia. Campinas: Secretaria Municipal atención: un modo mutante de hacer salud. In: Eibenschutz C, organizador. Política de saúde: o 3. Prefeitura de Campinas. Paidéia – saúde da famí- público e o privado. Rio de Janeiro: Editora Fio- lia, programa da Secretaria Municipal de Saúde. Campinas: Secretaria Municipal de Saúde; 2001.
14. Campos GWS. Um método para análise e co-gestão 4. Ministério da Saúde. Documento base para de coletivos. São Paulo: Editora Hucitec; 2000.
gestores e trabalhadores do SUS – cartilha da 15. Uribe Rivera FJ. Reflexões sobre a subjetividade na PNH. http://www.saude.gov.br (acessado em 14/ gestão a partir do paradigma da organização que aprende. Ciênc Saúde Coletiva 2001; 6:209-19.
5. Brasil. Portaria n. 1.935. Saúde mental no SUS: os 16. Camargo Jr. KR. Biomedicina, saber & ciência: uma centros de atenção psicossocial. Diário Oficial da abordagem crítica. São Paulo: Editora Hucitec; 2003.
17. Artmann E, Uribe Rivera FJ. A démarche strategique 6. Ministério da Saúde. Guia prático do programa (gestão hospitalar estratégica): um instrumento de de Saúde da Família, Núcleo de Atenção Integral. coordenação da prática hospitalar baseada nos http://www.saude.gov.br/bvs (acessado em 21/ custos de oportunidade e na solidariedade. Ciênc 7. Campos GWS. O anti-Taylor: sobre a invenção 18. Chiavenato I. Introdução à teoria geral da admin- de um método para co-governar instituições de istração. 3a Ed. São Paulo: Editora McGraw-Hill; saúde produzindo liberdade e compromisso. Cad 19. Organização Pan-Americana da Saúde/Organiza- 8. Starfield B. Primary care: concept, evaluation and ção Mundial da Saúde. A transformação da gestão policy. New York: Oxford University Press; 1992.
de hospitais na América Latina e Caribe. Brasília: 9. Prefeitura de Campinas. Plano de saúde da Sec- Organização Pan-Americana da Saúde/Organiza- retaria Municipal de Saúde. Campinas: Secretaria 20. Malik AM, Schiesari LMC. Qualidade na gestão lo- 10. Novaes HM. Ações integradas nos sistemas locais cal de serviços de saúde. São Paulo: Faculdade de de saúde – SILOS. São Paulo: Biblioteca Pioneira Saúde Pública, Universidade de São Paulo; 1998. de Administração e Negócios; 1990.
Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 22(X):1547-1555, xxx, 2006 METODOLOGIA PARA GESTÃO DO TRABALHO INTERDISCIPLINAR EM SAÚDE 21. Nogueira RP. A saúde pelo avesso. Natal: Editora 27. Starfield B. Atenção primária: equilíbrio entre ne- cessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília: 22. Prochnow AG, Leite JL, Erdmann AL. Teoria inter- Organização das Nações Unidas para a Educação, pretativa de Geertz e a gerência do cuidado: visu- a Ciência e a Cultura/Ministério da Saúde; 2002.
alizando a prática social do enfermeiro. Rev Lati- 28. Cortes SMV. Councils and conferences in the Bra- zilian health system of health: building the road 23. Schiesari LMC. Cenário de acreditação hospitalar for user participation. Sociologias 2002; 7:18-48.
no Brasil: evolução histórica e referências externas 29. Campos RO. O encontro trabalhador-usuário na [Dissertação de Mestrado]. São Paulo: Faculdade atenção à saúde: uma contribuição da narrativa de Saúde Pública, Universidade de São Paulo; psicanalítica ao tema do sujeito. Ciênc Saúde Co- 24. Gurgel Jr. GD, Vieira MMF. Qualidade total e ad- 30. Jameson F. Pós-modernismo: a lógica cultural do ministração hospitalar: explorando disjunções capitalismo tardio. São Paulo: Editora Ática; 1996.
conceituais. Ciênc Saúde Coletiva 2002; 7:325-34.
31. Saupe R, Certulo LR, Wendhausen AL, Benito GA. 25. Reis COO. Desigualdade no acesso aos serviços Competências dos profissionais da saúde para o de saúde. In: Negri B, Giovanni G, organizadores. trabalho interdisciplinar. Interface Comun Saúde Brasil: radiografia da saúde. Campinas: Núcleo de Estudos de Política Pública, Universidade Estadual 32. Luz MT. Natural, racional, social: razão médica e racionalidade científica moderna. São Paulo: Edi- 26. Vasconcelos CM. Paradoxos da mudança no SUS [Tese de Doutorado]. Campinas: Faculdade 33. Carvalho AI. Da saúde pública às políticas de Ciências Médicas, Universidade Estadual de saudáveis – saúde e cidadania na pós-moderni- dade. Ciênc Saúde Coletiva 1996; 1:104-21.
Recebido em 31/Out/2005Versão final reapresentada em 28/Abr/2006Aprovado em 20/Jun/2006 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 22(X):1547-1555, xxx, 2006

Source: https://salud.santafe.gov.ar/cursogestionreconquista/documentos/materialdeestudio/unidad_2/Apoio%20matricial%202006.pdf

Stampa impotenza

Vincere l'impotenza.qxp 3-08-2005 13:44 Pagina 1 VINCERE L’IMPOTENZA a cura di Davide Dèttore e Gabriele MelliVincere l'impotenza.qxp 3-08-2005 13:44 Pagina 2 COPING WITH ERECTILE DYSFUNCTION Traduzione: Marco TagliaferriCura: prof. Davide Dèttore, dott. Gabriele MelliEditing e videoimpaginazione: Camilla RomoliCopyright © 2004 by Michael Metz and Barry McCarthyNew Harbinger Publicat

Microsoft word - cholestérol et acidité.docx

L'arnaque du cholestérol (13 juin 2012) www.santenatureinnovation.fr Santé Nature Innovation est un service d’information sur la santé des Nouvelles Publications de la Santé Naturelle ************************************************************************************************************************************* J'ai déclenché un mini-scandale il y a quelques semaines e

Copyright © 2014 Medical Pdf Articles