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UMA ANÁLISE SOBRE A INFLUÊNCIA DO ASPECTO CULTURAL NO DESENHO DOS
SISTEMAS DE CONTROLE DE GESTÃO: ESTUDO DE CASOS
Adriane Fagundes Sacramento da Silva
Mestre em Ciências Contábeis pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ
(2010). Possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Minas
Gerais (1998).

Josir Simeone Gomes
Possui graduação em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1972),
graduação em Contabilidade pela Fundação Getúlio Vargas - RJ (1973), mestrado em
Administração pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1978) e doutorado em
Administração pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1983). Atualmente é Professor
Adjunto e Coordenador do Mestrado em Ciências Contábeis da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro e Editor da Revista de Contabilidade do Mestrado em Ciências Contábeis
(UERJ). Tem experiência na área de Administração, com ênfase em Administração, atuando
principalmente nos seguintes temas: controle gerencial, controle de gestão, orçamento
público, contabilidade gerencial e controle em estatais.
Área Temática: D) Contabilidad y Control de Gestión
Palavras-chave: Controle de Gestão; Cultura Nacional; Práticas Gerenciais.
UMA ANÁLISE SOBRE A INFLUÊNCIA DO ASPECTO CULTURAL NO DESENHO DOS
SISTEMAS DE CONTROLE DE GESTÃO: ESTUDO DE CASOS

Nas últimas décadas, pesquisadores como Geert Hofstede e Fons Trompenaars começaram
a estudar o papel da cultura nacional no desenho dos sistemas de controle de gestão das
organizações pressupondo que a cultura nacional configura-se como fator importante na
administração das empresas. A assim chamada “corrente divergente” propôs analisar o
impacto dessas diferenças sobre os estilos de liderança, processos de negociação, gestão
de pessoas, motivação e gestão de conflitos sob a premissa de que condições particulares,
de maneira geral, demandam soluções específicas, que podem se tornar inadequadas se
aplicadas em outros contextos. O presente estudo tem como objetivo identificar se o
elemento cultural é considerado no desenho do controle de gestão das empresas
estrangeiras. Para tanto, foi analisado o caso de duas organizações de controle acionário
estrangeiro localizadas na cidade do Rio de Janeiro pertencentes às dimensões: alta
distância hierárquica, coletivismo, feminino, alta fuga à incerteza, proposta por Hofstede. Os
resultados obtidos sugerem que alguns aspectos da cultura brasileira são preservados; no
entanto, verifica-se uma transferência de práticas gerenciais desenvolvidas em países de
culturas diversas que por conseqüência, geram alguns conflitos nas organizações.

1 INTRODUÇÃO

A globalização, fenômeno gerado pela necessidade da dinâmica do capitalismo de ampliar os mercados globalmente em virtude da saturação dos mercados internos, intensifica o processo de internacionalização das empresas, com a conseqüente concentração do poder em mega-empresas e integração comercial entre os países. Conforme menciona Tanure (2005), as tradicionais fontes de vantagem competitiva, tais como baixo custo, tecnologia ou acesso ao capital continuam sendo condições necessárias, mas não mais suficientes para garantir o sucesso. Uma das competências requeridas é a atuação em diferentes países, o que demanda habilidades específicas que têm como pressuposto o conhecimento do próprio estilo de gestão. Nesse quadro de profunda transição, grandes são os questionamentos à respeito dos fatores que devem ser enfatizados com vistas à obtenção de um desempenho organizacional superior. Entre tantos fatores, têm sido amplas as discussões sobre o significado ou o impacto da cultura de determinado país (cultura nacional) nos negócios. Dentre as correntes que discutem a importância do elemento cultural no desenho do controle de gestão, destaca-se a corrente divergente que acentua as diferenças de estilos gerenciais entre países e regiões e analisa o impacto dessas diferenças. Autores como Alves (1997) questionam a existência de uma relação direta entre a performance de uma organização e sua cultura e a comprovação de que a cultura organizacional “carrega” muito da cultura nacional, demandaria uma compreensão das “raízes” como ponto crucial no gerenciamento das organizações. Em resumo, a internacionalização das organizações possui uma dimensão objetiva que é compatível com métodos, práticas e ferramentas e uma dimensão subjetiva, ligada aos assuntos culturais, que por conseqüência, relacionam-se às pessoas cujo trato é sempre mais complexo e demanda competência e sensibilidade para perceber os valores fundamentais das pessoas, suas motivações e os traços culturais que contribuem para modelar seus comportamentos. Conforme mencionado por Hofstede (1997), a globalização dos negócios não leva à globalização das mentes, só podendo ser bem sucedida se levar em conta os diferentes caminhos pelos quais as mentes e as sociedades humanas funcionam. Neste contexto, o propósito desta pesquisa foi identificar se as características da cultura nacional são consideradas no desenho do controle de gestão das empresas
estrangeiras, entendendo como empresa estrangeira, aquela em que o controle acionário
pertence a um país estrangeiro.

2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1 - Abordagens sobre Controle Gerencial

Para Anthony e Govindarajan (2002), o controle gerencial é o processo pelo qual os executivos influenciam outros membros da organização, para que sigam às estratégias adotadas. Este processo inclui várias atividades, como planejar o que a organização deve fazer, coordenar as atividades de várias partes da organização, comunicar e avaliar a informação, de forma a posicionar-se sobre qual decisão deve ser tomada e influenciar as pessoas para que alterem seu comportamento. No entanto, apesar de sistemático, o processo de controle gerencial não é mecânico, pois envolve interações entre indivíduos. Auxilia a administração a conduzir a organização na direção de seus objetivos, devendo-se concentrar principalmente na execução da estratégia, que é diferente de organização para organização. Para tal, os sistemas de controle devem ter uma preocupação constante na definição de comportamentos adequados à estratégia definida, objetivando assegurar que estas sejam seguidas, de forma que os objetivos da organização sejam atingidos. (AGUIAR e FREZATTI, 2007; ANTHONY e GOVINDARAJAN, 2002). Para Walter, Cruz e Espejo (2009), necessário se faz considerar o ambiente na qual a organização se reporta para incorporar suas concepções e valores, evidenciando o foco da organização para a tomada de decisões estratégicas. Para tanto, Gomes e Salas (2001) consideram imprescindível possuir um conjunto de sistemas e instrumentos que promovam a atuação das diferentes pessoas ou grupos a responderem aos desafios do contexto social e competitivo, de forma oportuna e guardando coerência com as diretrizes estabelecidas. A atuação da administração pode ser muito importante no desenho de um sistema e na realização de um processo que permita influir decisivamente no comportamento das pessoas para que atuem de acordo com os objetivos negociados pela administração. Conforme Tanure e Prates (1996), a análise das organizações tem tido o suporte de várias teorias administrativas que alteram suas ênfases entre aspectos mais mecanicistas, mais comportamentais ou mais sociais. Em especial, estes autores propõem um enfoque cultural, circunscrita pelos limites estabelecidos pelo caráter cultural do ambiente em que atua. As ações administrativas têm um contorno cultural que as influencia a ponto de poder caracterizar um estilo de conduzir as organizações. A partir de alguns elementos básicos, as ações combinam entre si e com intensidades diferentes, definem a cultura da própria organização, sendo, pois, a cultura nacional um componente importante, na formação da cultura organizacional. 2.2 As relações entre cultura nacional, cultural organizacional e controle de gestão

Neste contexto, torna-se fundamental conceituar cultura nacional e organizacional, bem como elucidar as suas relações com o controle de gestão. Conforme Alves (1997) é difícil estabelecer uma única definição de cultura e as conceituações que proliferam com o correr do tempo apresentam variações de acordo com a finalidade ou natureza da pesquisa. No entanto, a maioria dos conceitos existentes entende cultura como um complexo padrão de comportamentos, hábitos sociais, significados, crenças, normas e valores selecionados historicamente, transmitidos coletivamente, e que constituem o modo de vida e as realizações características de um grupo humano. Para Trompenaars (1994, p.6), “a cultura é a forma por meio da qual um grupo de pessoas resolve problemas”. Toda cultura se distingue das outras por meio de soluções específicas a determinados problemas. Hofstede (1997, p. 19), sinteticamente menciona que cultura (nacional) é “a programação coletiva da mente que distingue os membros de um grupo ou categoria de pessoas face a outro”. Já a cultura organizacional é definida por Gomes e Salas (2001, p. 36), como “um conjunto de crenças básicas inventadas, descobertas ou desenvolvidas por um grupo, à medida que aprende a confrontar-se com sua necessidade de adaptação ao contexto social e de alcançar a integração interna.” Presume-se que na cultura de uma organização vigora dois importantes elementos: as normas e os valores. Quanto mais consistentes forem as normas e os valores, ou seja, quanto mais as normas estiverem baseadas nos valores existentes, mais facilmente as pessoas cumprem. Porém, naqueles casos em que as normas não têm eco nos valores predominantes, é gerada grande tensão. O orgulho das pessoas de pertencer à determinada empresa é maior quando as normas refletem os valores próprios do grupo. Quando isso não ocorre, o resultado pode ser a desintegração. Conforme bem assinalam Gomes e Rocha (1996, p. 6), Conhecer a influência da cultura no desenho dos sistemas de controle gerencial é de fundamental importância para o sucesso da empresa. Os sistemas de gestão devem estar adaptados e reagir adequadamente tanto em relação à cultura organizacional – plano cultural interno – quanto em relação ao meio ambiente – plano cultural externo. No primeiro sentido, o desenho e a utilização do sistema de controle da empresa deve espelhar valores, crenças, expectativas internas. No segundo sentido, deve estar apto para refletir positivamente o estado e as alterações dos cenários culturais de um determinado ambiente. Os autores complementam que a falta de entendimento sobre o peso da cultura no desenho, implantação ou utilização de um sistema de controle, pode gerar problemas que variam de forma ou magnitude, segundo as características da estrutura da empresa, da tecnologia, do meio ambiente e dos próprios valores já atuantes na organização, que são capazes de gerar comportamentos imprevisíveis e, por vezes, contrários à congruência de objetivos, como apregoa o papel principal dos sistemas de controle gerencial. Ao promover uma identificação coletiva, a cultura pode complementar o controle gerencial, facilitando sua aceitação e utilização. Assim, é natural que um sistema de controle seja fortemente influenciado pelo estilo da cultura organizacional. Neste sentido, Freitas (1997) assinala que quando as organizações importam metodologias de análise de cultura organizacional, que não pressupõem a cultura nacional, esquecendo que aspectos importantes da cultura da organização emanam de traços da cultura nacional, as estratégias e práticas gerenciais perdem sentido. Cada vez mais, é reconhecido que o sucesso não depende apenas de mudanças nas estruturas da organização, como padrões de autoridade, divisão do trabalho, métodos de controle, formas de comunicação interna, etc., mas fundamentalmente das mudanças em atitudes e percepções de seus indivíduos e estas formas de agir e perceber são representações de pressupostos e valores culturais de uma organização. Tanure (2005) e Gomes e Rocha (1996) acreditam que as práticas de administração que encontram eco nos valores culturais nacionais parecem ser mais aptas a produzir comportamentos previsíveis, eficazes e de alto desempenho de forma que a congruência entre práticas de gestão, cultura nacional e organizacional geram melhor performance. Um sistema de controle pode promover uma cultura organizacional orientada para a eficácia e para resultados satisfatórios ou, ao contrário, a uma cultura direcionada para o controle burocrático e avessa à mudanças. É fundamental entender o complexo jogo que se instaura entre culturas organizacionais e culturas abrangentes. É possível que se encontre situações de predominância de uma dada cultura organizacional sobre a cultura abrangente, em função, por exemplo, do espaço político, econômico ou social ocupado pela organização no país, comunidade ou região. No pólo oposto, uma determinada cultura abrangente, seja ela de porte nacional ou regional, pode alterar de modo significativo ou mesmo inviabilizar uma cultura organizacional. Deve-se perceber a cultura como um elemento abrangente – um conjunto sistêmico de valores, crenças e normas – que se coloca além da cultura organizacional, que é referente e peculiar a uma dada organização. (GOMES e ROCHA, 1996). Cultura nacional e cultura organizacional estão, portanto, inter-relacionadas. Por mais distintas que sejam as práticas entre as organizações de um mesmo país, elas têm traços comuns, que resultam da cultura comum. Conforme Hofstede (1997), ao nível nacional, as diferenças culturais residem mais nos valores e menos nas práticas, mas ao nível organizacional, as diferenças culturais residem mais nas práticas e menos nos valores. A diferença de equilíbrio/valores/práticas, pode ser explicada pelos diferentes lugares de socialização (aprendizagem) para os valores e práticas, visto que os valores são adquiridos precocemente na vida. Já as práticas organizacionais são aprendidas através da socialização no lugar de trabalho, onde a maioria das pessoas entra na idade adulta, com a maior parte dos seus valores firmemente enraizados. 2.3 Modelos Culturais

Por volta das décadas de sessenta e setenta, várias pesquisas foram realizadas baseando-se no conceito da cultura nacional como um componente formador da cultura organizacional, fazendo parte da chamada “corrente divergente”. Dentre vários pesquisadores, serão abrangidos neste estudo, os trabalhos de Hofstede (1997) e Trompenaars (1994), comumente citados na literatura. Hofstede (1997) pesquisou funcionários da IBM de cerca de 50 país es nas décadas de setenta e oitenta e com base nos resultados, classificou os países segundo quatro dimensões por ele desenvolvido. A primeira destas dimensões, a chamada distância hierárquica (IDH) representa
“a medida do grau de aceitação, por aqueles que têm menos poder nas instituições e organizações de um país, de uma repartição desigual do poder” (HOFSTEDE, 1997, p. 42). O grau de individualismo/coletivismo relaciona-se a forma como os indivíduos
tendem a se comportar: individualmente ou em grupo. O individualismo caracteriza as sociedades nas quais os laços entre os indivíduos são pouco firmes , devendo cada um ocupar-se de si mesmo e da sua família mais próxima. Contrariamente, o coletivismo caracteriza as sociedades nas quais as pessoas são integradas, desde o nascimento, em grupos fortes e coesos, que as protegem para toda a vida em troca de uma lealdade inquestionável. (HOFSTEDE, 1997, p. 69) A terceira dimensão, o chamado grau de masculinidade/feminilidade, relaciona-se
à forma como os indivíduos se comportam: nas sociedades masculinas, os papéis são nitidamente diferenciados, devendo o homem ser forte, impor-se e interessar-se pelo sucesso material, enquanto a mulher deve ser mais modesta, terna e preocupada com a qualidade de vida. Nas sociedades femininas os papéis sociais dos sexos se sobrepõem, de forma que tanto os homens como as mulheres devem ser modestos, ternos e preocupados com a qualidade de vida. (HOFSTEDE, 1997, p. 103) De acordo com Hofstede (1997, p. 135), o índice de controle da incerteza (ICI),
quarta dimensão encontrada, “mede o grau de inquietude dos seus habitantes face às situações desconhecidas ou incertas. Este sentimento exprime-se, entre outros, pelo stress e a necessidade de previsibilidade: uma necessidade de regras, escritas ou não.” Sinteticamente, Hofstede (1997) menciona que em sociedade de elevado ICI, “o que é diferente é perigoso” e pelo contrário, nas sociedades de baixo ICI, o credo é de que “o que é diferente é curioso”. De forma semelhante, Trompenaars (1994) definiu sete dimensões, sendo que cinco delas compreendem as formas com os humanos se relacionam entre si. A primeira
dimensão diferencia as sociedades nas quais as regras devem valer para todos - culturas
universalistas
- ao passo que nas culturas particularistas, dá-se mais atenção às
obrigações dos relacionamentos e circunstâncias específicas, pois a amizade tem
obrigações especiais e, portanto, é prioritária.
A segunda destas dimensões, individualismo vs. coletivismo corresponde à
dimensão de Hofstede. Nas culturas individualistas, as pessoas realizam -se sozinhas e assumem responsabilidades pessoais, ao contrário das culturas coletivistas. A dimensão neutro vs. emocional revela se a natureza das interações deve ser
objetiva e imparcial ou é aceitável expressar emoção. Nas culturas neutras (em regiões como na América do Norte e no noroeste europeu), a premissa é que as pessoas devem parecer como máquinas para que se possa operar mais eficientemente. Já em culturas afetivas ou emocionais, os negócios são questões humanas e toda gama de emoções é considerada apropriada. A quarta dimensão específico vs. difuso refere-se à forma e a variedade dos
envolvimentos. Nas culturas específicas, as pessoas são mais diretas, os conflitos de interesse não são bem vistos, exigindo-se que as instruções de trabalho sejam claras, precisas e detalhadas, garantindo a melhor concordância ou permitindo aos empregados discordar em termos claros. Já nas culturas difusas, a moralidade é altamente circunstancial, dependendo da pessoa e do contexto encontrado. As questões pessoais e profissionais se interpenetram. Instruções ambíguas e vagas são vistas como permitindo interpretações sutis e receptivas, por meio das quais os empregados podem exercitar o julgamento pessoal. A quinta dimensão categoriza os indivíduos pelo o que ele fez recentemente e pelo seu histórico (culturas voltadas para a conquista); já nas culturas orientadas para a
atribuição significa que o status é conferido pelo seu nascimento, parentesco, sexo ou
idade, pelas suas conexões e sua formação acadêmica.
A sexta dimensão, conforme Trompenaars (1994) diferencia as sociedades na forma como estas encaram o tempo. Nas culturas sequenciais, relativamente às relações
profissionais, executa-se apenas uma atividade de cada vez, mantendo os compromissos de
forma rígida e as relações são subordinadas ao cronograma. Nas culturas sincrônicas,
executa-se mais de uma atividade ao mesmo tempo e os compromissos são sujeitos ao
tempo dedicado a outros assuntos significativos e os cronogramas são subordinados às
relações.
A última dimensão define a forma como os indivíduos se comportam em relação ao ambiente. Segundo Trompenaars (1994), algumas culturas acham que o ponto focal que
afeta suas vidas e as origens do vício e da virtude residem na pessoa: nas culturas
orientadas
internamente, a atitude é dominadora e uma pessoa convicta requer conflito e
resistência, devendo-se focar em si mesmo, na própria função, grupo ou empresa. Já nas
culturas orientadas externamente , o foco é no “outro”, a atitude é flexível, visando
comprometer-se e manter em paz. A harmonia e receptividade simbolizam sensibilidade.
Ouvir é considerado uma característica mais admirável do que falar, não entrando em
conflito abertamente.

2.4 Caracterização da Cultura Brasileira

O gerenciamento brasileiro pode ser definido em função das características da sua cultura nacional. Valores culturais, como o coletivismo, o 'jeitinho', a informalidade, o protecionismo, o personalismo e a afetividade influenciam o tipo de gestão (TANURE e CANÇADO, 2005 apud SILVA, GASSENFERTH e SILVA, 2008). Neste sentido, os traços culturais brasileiros serão destacados a seguir de forma a permitir a influência destes sobre a gestão. Dentre estes, a concentração de poder – equivalente à dimensão distância
hierárquica de Hofstede – sustenta-se ante à existência do personalismo. A responsabilidade pela tomada de decisão está nas mãos do líder, ainda que o discurso seja feito no sentido da participação e consenso, valendo o dito popular: “manda quem pode, obedece quem tem juízo.” (TANURE e PRATES, 1996). O personalismo, outro traço de nossa cultura, é definido pelo conceito da
autoridade, cuja base legítima é o carisma. Neste sentido, a rede de amigos e parentes, no Brasil, é o caminho natural pelo qual as pessoas fazem uso para resolverem seus problemas, obter privilégios, se diferenciando pela hierarquia e pelas relações pessoais, nas quais os indivíduos encontram seus sistemas de suporte, conectando-se com o ambiente externo e enfrentando a impessoalidade da burocracia, das leis e das instituições. (ROCHA, 2000). A combinação dos dois traços mencionados - concentração de poder e personalismo - tem como síntese, o paternalismo, que apresenta duas facetas: o patriarcalismo e o
patrimonialismo. Conforme Tanure e Prates (1996), os traços históricos brasileiros revelam
uma característica na qual a autoridade máxima está centrada no pai. Entende-se que ao
patriarca tudo pode e aos membros do clã cabe pedir e obedecer, pois do contrário, a
rebeldia pode ser premiada com a exclusão no âmbito das relações. Desta forma,
conjuntamente com o patrimonialismo, que representa a face hierárquica e absoluta, é
imposta a sua vontade aos seus membros. A transferência de responsabilidades para
instâncias superiores confirma a relação de dependência criada pelo paternalismo
(combinação da concentração de poder e personalismo), bem como pela postura de
espectador por parte dos subordinados.
Freitas (1997) complementa o argumento ao afirmar que assim como nas relações de domínio patriarcal colonial, mistura-se uma relação puramente econômica com laços pessoais e de amizade. O patrão ao dominar seu trabalho oferecendo o emprego, também domina suas aspirações e reivindicações, pois apela para a moralidade das relações. O rompimento das relações significa uma derrota moral para o chefe. O autor enfatiza que o empregado, ao sentir-se protegido, retribui com lealdade a seu superior. Tudo isso confunde o empregado e permite ao patrão exercer duplo controle da situação. Garante-se, pois, a não ruptura, com cada um dos membros atingindo o máximo de benefício com um mínimo de custo, pago nas duas espécies de moeda, afetiva e fiduciária. A aceitação do autoritarismo, por meio do paternalismo (e passividade) nas relações é alcunhado por Holanda (1984), como o “homem cordial”, influenciando a vida religiosa e
social, a linguagem, as relações comerciais e a vida organizacional, em que a troca de
favores desenvolve uma dependência moral para com o outro, dissuadindo o
questionamento e o rompimento da relação.
Nesta teia de relações, esta sociedade não tratará seus conflitos abertamente, pois isto cria constrangimentos e mina a harmonia do grupo. É comum encontrar soluções
indiretas (triangulações) entre os pólos divergentes, através de um terceiro que mantenha
boas relações pessoais com ambos, com o objetivo de “evitar conflito” . Este traço
identifica-se com a expressão popular “dou um boi para não entrar na briga, mas uma
boiada para não sair”. (TANURE e PRATES, 1996)
Os liderados brasileiros não impõem uma barreira à extensão da autoridade dos seus chefes. Existe uma alta aceitação da desigualdade de poder e o reconhecimento de que os líderes tenham o direito de usufruir seu privilégio. Estes exigem de seu liderado o comportamento leal e de evitar conflito, conforme ele se comporta para cima. “Se a cultura é paternalista, esta cultura será transmitida até o último nível. Na maioria das vezes, é isto que acontece na prática, apesar de no discurso ser bastante diferente”. (TANURE e PRATES, 1996, p. 89). A lealdade que permeia as relações constitui-se no recurso pelo qual as pessoas
contornam as dificuldades decorrentes do formalismo, outro traço presente na cultura
brasileira. Este associa-se à dimensão controle da incerteza dos estudos de Hofstede e
conforme mencionado por Tanure e Prates (1996, p. 61), “a solução para a rigidez
institucional faz-se via tráfego das redes de relacionamento pessoal.” No entanto, em
pesquisa realizada recentemente, Tanure (2005) substituiu a expressão formalismo por
ambigüidade, a partir da constatação da redução do índice de controle da incerteza,
quando da aplicação da pesquisa de Hofstede no Brasil e demais países da América Latina.
Se as normas são bastante específicas, o ajustamento se faz por um processo de reinterpretação das leis, cujo resultado vai depender de quem está do outro lado da questão: se a pessoa pertence ao grupo ou tem autoridade, a flexibilidade é ampla, sendo o contrário também verdadeiro. Estes processos são permitidos e podem atingir as configurações de um nepotismo, favoritismos e até subornos, além de gerar instabilidade e insegurança, o que no Brasil leva a uma completa desmoralização. (TANURE e PRATES, 1996). Este traço, conforme Da Matta (1986), reflete um verdadeiro combate entre leis que devem valer para todos, mas só podem funcionar para quem as tem. Este autor acredita que a cultura brasileira caracteriza-se pelo antagonismo entre a igualdade e a hierarquia. A igualdade está baseada nos princípios da democracia e da igualdade perante a lei. A hierarquia é um conjunto de identidades sociais precisas, como as que são dadas pelas teias de relações sociais nascidas da família, da vizinhança, no compadrio, da nominação e acima de tudo, do parentesco. Face ao exposto, surge o traço da impunidade, que tanto podem reforçar como
minar a manutenção e a estabilidade do sistema de ação cultural brasileiro. A impunidade ganha relevância à medida em que estando os líderes ao largo das punições, fortalece sobretudo, sua posição de poder. Estas características impactam no processo de motivação, tendo em vista que a manutenção de um corpo de funcionários que tem maior tempo de casa, não pelo reconhecimento de sua sabedoria e competência funcional, mas por se reconhecer nele o comando das vias de acesso às pessoas, tende a gerar um clima de baixa motivação e de grande permissividade nas organizações. Como a atração pela tarefa não é estimulada, o desempenho e a competência nem sempre são reconhecidos ou estimulados (no conceito de que a cultura brasileira é mais estimulada para o ser do que para o fazer). O argumento dado por Tanure e Prates (1996) é de que se a lei só existe para os indiferentes e onde os direitos individuais são monopólios de poucos, a apatia só pode crescer, deixando o brasileiro cada vez mais espectador. No extremo, a situação ficaria próxima do dito popular “salve-se quem puder” ou a expressão conhecida como a lei de Gerson de que “é preciso levar vantagem em tudo”. A lógica então se inverte e transforma-se em heróis, aqueles que conseguem resultados positivos com a transgressão da lei e o prêmio do ponto de vista da punição torna-se, portanto, a impunidade. Todos estes elementos acabam por alimentar uma postura de espectador, que, por
sua vez, tem como suas principais vertentes a baixa consciência crítica e por conseqüência, baixa iniciativa, pouca capacidade de realização e transferência de responsabilidade das dificuldades para as lideranças, sempre imputando ao outro a responsabilidade visto que não sendo o indivíduo quem tomou a decisão, a responsabilidade também não é dele. (TANURE e PRATES, 1996). O “medo de errar” surge como contraparte do paternalismo e articula e reforça as
características culturais da postura de espectador e de evitar conflito, visto que o desejo de acertar sempre e ser aceito pelo grupo faz parte da expectativa e necessidade do liderado frente ao “grande poder”. Os traços - postura de espectador e “evitar conflito” – se bem manejados, podem produzir características como a criatividade e o pragmatismo. Tanure e Prates (1996) citam
que no Brasil, estes traços refletem em uma habilidade de contornar uma dificuldade à
despeito da lei que, conforme Barbosa (1982), relaciona-se ao “jeitinho” , uma forma
“especial” de se resolver algum problema ou situação difícil ou proibida ou uma solução
criativa para alguma emergência, seja sob a forma de burla a alguma regra ou norma
preestabelecida ou sob a forma de conciliação, esperteza ou habilidade.
O traço do espectador é revelado na forma como a geração de idéias para a mudança é encarada. Tanure e Prates (1996) expõem que ainda que os brasileiros se
mostrem criativos, é necessário que haja uma recomendação explícita do chefe para
desenvolver o projeto; do contrário, as idéias ficam apenas como idéias. Estes aspectos
refletem em práticas gerenciais de manutenção da situação atual, investimentos de baixo
risco, atividades de planejamento não voltados para a inovação e mudanças, opção pelo
crescimento cauteloso.

3 METODOLOGIA

Este artigo é fruto de uma dissertação de mestrado em Ciências Contábeis da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, que desenvolveu um estudo exploratório qualitativo, enquadrando-se como uma pesquisa dedutiva, já que uma estrutura conceitual e teórica foi desenvolvida e depois testada pela observação empírica. (COLLIS e HUSSEY, 2005, p. 27). De acordo com o tipo de pesquisa a ser realizado, esse trabalho utiliza o método do estudo de caso. No estudo em questão, a unidade de análise são empresas estrangeiras instaladas na cidade do Rio de Janeiro e refere-se a um estudo de caso múltiplo. As duas empresas pesquisadas – que serão qualificadas como Empresas A e B - são de origem francesa. Para fins comparativos, o Brasil e a França pertencem à seguinte classificação de Hofstede: Dimensão cultural
Quadro 1: Dimensões culturais do Brasil e França.
Fonte: baseado em Hofstede (1997).

Para o estudo de caso da pesquisa em referência foram colhidos dados qualitativos através de entrevistas pessoais conjuntamente com a observação, que permitiu ao entrevistador capturar reações e atitudes do entrevistado no momento da entrevista. Na Empresa A, a entrevista foi conduzida em duas etapas por um período de duas horas cada uma e foram entrevistados o coordenador de Recursos Humanos, o contador e o analista contábil. Na empresa B, a entrevista foi conduzida em uma etapa por um período de três horas e foi entrevistado o responsável pelo departamento de Controle de Gestão; ambas, através de agendamentos antecipados. As variáveis de pesquisa foram relacionadas ao sistema de controle gerencial e aos elementos culturais no desenho do controle de gestão.
4 ANÁLISE DOS CASOS
4.1 Variáveis relacionadas ao sistema de controle gerencial

A Empresa A é uma empresa que iniciou suas operações em 2004, possui uma estrutura pequena, com forte presença de cultura organizacional estatal, já que o controle acionário pertence a uma estatal francesa e uma brasileira, com o corpo diretivo e gerencial composto por profissionais provenientes do setor (matriz francesa e ex funcionários de uma empresa de influência estatal). Conforme observa Fleury e Fischer (1989) apud Motta (1996) há o mito da “grande família” na empresa estatal e dentre outras características, é identificado o paternalismo nas relações. (PIRES e MACÊDO, 2006). A Empresa B, mais antiga e robusta em termos do seu quadro de funcionários, representa uma unidade centralizada, na medida em que as estratégias são definidas pela matriz (empresa global), sem a participação direta das unidades locais, cabendo-lhes fornecer as informações solicitadas para a tomada de decisões, inclusive sobre a distribuição dos recursos entre suas unidades, de forma que recursos financeiros gerados por algumas unidades serão utilizados para financiar outras. Do ponto de vista de Fonseca (2007), e considerando a perspectiva de Trompenaars (1994), este modelo segue o conceito de cultura universalista, em que a alta administração elabora regras gerais para as pessoas seguirem, supondo-se que os conceitos universais sejam capazes de organizar a realidade. No entanto, o Brasil possui características de uma cultura particularista, na qual não se aplica regras gerais para todos, mas submete-as ao crivo das relações pessoais e às peculiaridades de cada situação. Neste processo revela-se uma relação autoritária, uma grande distância hierárquica entre a matriz e suas unidades, na medida em que a unidade participa do processo como um “depósito de dados”, cabendo a ela acatar as decisões da matriz. Um grande IDH é verificado na França e está presente também no Brasil. Sobre este aspecto, a Empresa A possui uma maior independência para formular seus objetivos e metas, porém sempre subordinado às macro diretrizes da matriz. O mesmo não se pode dizer do processo de comunicação dos objetivos e metas aos funcionários. Os entrevistados de ambas as empresas descreveram um processo de comunicação aberta, com possibilidades de questionamento. No entanto, o entrevistado da Empresa B mencionou que, de maneira geral, os funcionários da organização não gostam de questionar e serem questionados, o que revela o traço da baixa iniciativa (postura de espectador) citado na literatura sobre a cultura brasileira. Dentre os instrumentos de controle de gestão utilizados, foram mencionados, sobretudo, os de caráter financeiro, com ênfase nos orçamentos. A prática do orçamento é bastante disseminada entre as empresas porque garante um planejamento financeiro por um período (normalmente um ano), onde permite-se o acompanhamento entre os valores reais com aqueles orçados. Porém a validade deste instrumento pode ser questionado em
culturas de IDH elevado, na medida em que a preparação do orçamento pressupõe um
processo de negociação de cada gestor com seu superior hierárquico, com uma
independência para negociar, dando a idéia de confronto; ou seja, está implícito que este
processo é válido para uma sociedade de baixa distância hierárquica, onde cada indivíduo,
responsável por seus atos, defenderá seus pontos de vista com autodeterminação.
(FONSECA, 2007). Tal fato ficou comprovado a partir da declaração do entrevistado da
Empresa B de que ao ser preparado o orçamento por todos os gestores e submetido para
aprovação à matriz, esta pediu uma redução dos custos, que obrigatoriamente foi acatada.
Variáveis
Empresa A
Empresa B
Perspectiva
Organizacional
• corpo diretivo composto por • corpo diretivo composto em sua Perspectiva
• definição de objetivos e • formulação de estratégias e Estratégica
• comunicação aberta dos • controle gerencial e elaboração Instrumentos de • indicadores financeiros • indicadores financeiros e não
controle gerencial
Quadro 2: Análise dos Resultados: variáveis relacionadas ao sistema de controle
gerencial

4.2 Variáveis relacionadas aos elementos culturais no desenho do controle de gestão

O estilo adotado pela Empresa A nas relações entre superiores e subordinados, foi apontado como um estilo “misto”. Isto porque se observa um estilo que mescla os estilos – autoritário e consultivo. A própria liderança abre espaço para a participação dos subordinados, mas em determinados momentos, encontra-se um cenário menos participativo, fazendo-se necessário pelo grau de conhecimento e responsabilidade. Já o entrevistado da Empresa B declarou enfaticamente que o estilo de relacionamento existente entre líder-liderado é menos participativo e o subordinado sente-se confortável nesta posição, já que ocorre a transferência de responsabilidade para níveis superiores e ambas as posições preferem não ser questionadas. Este aspecto revela ser um traço de concentração de poder aliado à postura de espectador, frente à baixa consciência crítica e iniciativa. Esta posição parece mais próxima da nossa sociedade, pois, conforme preconiza Fonseca (2007), a preferência por decisões individuais parece não ser adequada à cultura brasileira, onde a ênfase nas relações pessoais convida à participação de todos na discussão dos assuntos, porém, não envolve necessariamente atribuição de responsabilidade aos indivíduos. Ainda que as empresas tenham declarado situações relativamente distintas – modelo mais consultivo (Empresa A) e autoritário (Empresa B) – observa-se um traço de grande distância hierárquica - quando se considera que a Empresa A também tenha como característica a questão da tomada de decisão concentrar-se no chefe, ainda que os subordinados sejam ouvidos. Conforme Fonseca (1997) apud Fonseca (2007), os informantes de uma pesquisa realizada por esta autora, declararam gostar quando o chefe pede sua opinião e se sentem motivados com isso. Entretanto, quando os problemas tomam maiores proporções, os chefes são envolvidos na tomada de decisão, pois os indivíduos preferem não fazer nada com medo de perder os seus empregos, evitando tomar a decisão, que deve ser do chefe. Reforça-se ainda o fato de os subordinados da Empresa B não “levarem os problemas para cima”, preferindo não questionar, para não serem questionados. Este aspecto também evidencia uma alta aceitação da desigualdade de poder e o reconhecimento de que os líderes tenham o direito de usufruir seu privilégio. Os subordinados esperam que os líderes lhe digam o que fazer, pois as pessoas habituadas aos moldes da relação autoritária têm medo de tomar iniciativas e correr riscos. (TANURE e PRATES, 1996; TANURE, 2005). Com base nas declarações do entrevistado, a Empresa A demonstra adotar uma política de concessão de benefícios (incluindo salários, auxílios saúde, creche, entre outros), tendo como um de seus objetivos, reter o funcionário, face, sobretudo, o nível de especialização requeridos para o ramo de negócio da organização, principalmente nas funções operacionais. No entanto, demissões ocorreram em virtude de melhores oportunidades oferecidas pelo mercado e sobre este aspecto, o entrevistado manifestou-se de uma forma a sugerir que houve uma traição para com a empresa que o acolheu, uma derrota moral. Esta evidência confirma o argumento de que nas relações de domínio patriarcal, mistura-se uma relação econômica com laços pessoais: a organização oferece o emprego e proteção e o liderado assume deveres morais como um vínculo familiar, retribuindo com lealdade. Estes aspectos abordados definem uma relação patriarcal, uma faceta do paternalismo, traço de nossa cultura e componente da dimensão coletivista de Hofstede. Neste aspecto, talvez por não haver a mesma dependência da organização para com os funcionários, a Empresa B adota uma postura diferente. Demais traços paternalistas são observados na Empresa A, que tem como princípio, não demitir funcionários, somente em situações extremas. Os presidentes que assumiram a empresa, desde o início das operações, adotaram esta postura, o que novamente reflete o ângulo patriarcal de nossa cultura. Demitir funcionários também é considerado uma derrota moral, já que eles se consideram responsáveis pelo desenvolvimento e capacitação dos funcionários. Com base em uma gama de questões a serem ordenadas pelo entrevistado, na Empresa A constatou-se uma preponderância de valores coletivistas, assinalando uma dependência do empregado para com a empresa, no sentido daquilo que esta poderia fornecê-los (condições de trabalho, oportunidades de aprendizado/aperfeiçoamento e utilização de competências). Neste sentido, conforme mencionado acima, a empresa vai nesta direção, através da série de benefícios concedidos, inclusive para a manutenção do funcionário na empresa. Já na Empresa B, neste tópico, não se encontrou uma unidade, ainda que os valores declarados tendem mais para o coletivismo. Dos seis valores apresentados, a 2ª, 3ª e 5ª posição revelam este tipo de cultura (condições de trabalho, formação e utilização de competências, respectivamente) enquanto que a 1ª, 4ª e 6ª posição (tempo pessoal, desafio e liberdade para organizar o trabalho) revelam uma cultura individualista. Em termos da 1ª posição – tempo pessoal - pode haver um aspecto dual, entendido como um fator de qualidade de vida, tão apregoado na sociedade, não necessariamente um aspecto do individualismo, em seu sentido restrito. A Empresa A realiza avaliação de desempenho de seus funcionários pelo corpo diretivo, porém não deixa claro quais são as metas e objetivos a serem atingidos por eles (individualmente). Consolida-se neste aspecto, o traço cultural da ambigüidade, que em alguma medida, articula-se com a concentração de poder, já que os funcionários ao questionar sobre os critérios de avaliação ao departamento de Recursos Humanos, este não se pronuncia, indicando que procurem o corpo diretivo (quem de fato avalia) para se informarem como estes foram determinados. É certo que através deste comportamento, evidencia-se uma grande distância hierárquica, porque a expectativa é de que nenhum funcionário ousará neste sentido. Os funcionários adotam, portanto a postura de espectador, e como mencionado por Tanure (2005), deixam margem de manobra para aqueles que ocupam posição de poder. Já a Empresa B emprega o A.P.O (Administração por Objetivos) – prática típica de sociedades individualistas – que tem como base o estabelecimento de objetivos por superiores junto com os subordinados e com avaliação também conjunta após o período de operação. Este sistema operando em uma sociedade coletivista e com grande distância de poder pode gerar um descasamento, pois o respeito à hierarquia faz com que o subordinado aguarde os sinais diretos ou indiretos do superior sobre os objetivos a serem estabelecidos, discordâncias devem ser expressas de forma indireta. Considerando-se a declaração de que as relações pessoais são um traço da Empresa B, possivelmente explicaria as situações desconfortáveis geradas nos momentos da avaliação, caracterizando a perda de “face”, típica das sociedades coletivistas, ainda que a organização estabeleça avaliações periódicas no decorrer do ano, envolvendo líder e subordinado, o que diminuiria as distâncias de poder. Neste contexto, as duas empresas declararam não ser comum a prática dos feedbacks, pelo despreparo das pessoas em dar e receber. Conforme ilustra Fonseca (1987, p. 189) apud Fonseca (2007), em pesquisa realizada em uma multinacional, um funcionário declarou que o feedback tende a ser “construtivo para a empresa mas destrutivo para a minha pessoa”. Para ambas as empresas, a avaliação garante um incentivo variável, também típico de sociedades individualistas, em que os incentivos e bônus devem estar relacionados com o desempenho individual, funcionando como um mecanismo para encorajar e motivar os executivos a atingirem os objetivos da organização. (ANTHONY e GOVINDARAJAN, 2002). No entanto, para que este sistema funcione plenamente, os indivíduos devem ser motivados por desafios que lhe garantirão prêmios, de forma que a obtenção seja importante para a satisfação de seus desejos e recompensados pelo atingimento dos objetivos. Pressupõe-se que a cultura seja de baixa fuga à incerteza – já que deve-se aceitar riscos – e também masculina, já que o regime estimula a preocupação com a performance e o sucesso material. (FONSECA, 2007). Ambas as dimensões propostas por Hofstede (individualismo, masculino e baixa fuga à incerteza) são exatamente contrárias à sua classificação para o Brasil (coletivismo, meio feminino e alto controle da incerteza). Logo, ao contrário do que se pode pensar, tendo em conta que em ambas as sociedades pesquisadas foram encontradas uma forte preocupação com a estabilidade do emprego, pode-se inferir que as pessoas sejam mais motivadas pelo medo da punição do que uma realização através do desafio. Os entrevistados das duas empresas declararam que a meritocracia é o critério fundamental para as promoções. A meritocracia é uma prática também típica de sociedades individualistas e reflete princípios e valores baseados na premissa de igualdade de oportunidades. Uma evidência disso é que a Empresa B valoriza a rotatividade dos funcionários dentro das unidades da empresa global, assim como em termos de funções. Esta política “quebra” a manutenção de funcionários que se valem do maior tempo de casa, acessibilidade às pessoas, contrastando muitas vezes , com baixa competência funcional. Se de fato ocorre o mencionado, este aspecto entra em conflito em sociedades onde as relações pessoais prevalecem sobre a tarefa, como foi declarado pelo entrevistado da Empresa B. Estes dois aspectos observados – avaliação de desempenho individual e meritocracia – são observados por Trompenaars (1994) como típicas de culturas orientadas para a conquista. Para Schneider (1988 apud Fonseca 2007), quando a avaliação é feita com base na realização, a performance pode ser medida objetivamente porque o que é avaliado é comportamento e não características. No modelo brasileiro, onde são fortes as relações pessoais, pode-se caracterizar uma predominância de uma cultura voltada para a atribuição, onde o que está em julgamento são a integridade, a conduta moral e o espírito cooperativo. Logo, a promoção pelo critério de “tempo de casa”, atenderia melhor ao princípio de igualdade (conforme os preceitos da cultura brasileira) porque este é um atributo ao alcance de todos, dependendo da simples permanência no emprego enquanto o mérito depende do indivíduo e de suas especificidades, traduzindo-se em desigualdade tendo em conta que os indivíduos nascem em posições desiguais, possuem habilidades e talentos que não são responsabilidade do indivíduo e sim de toda a sociedade. Na cultura brasileira, “o esforço de cada um, a vontade de realizar (achievement) e as diferenças de talento naturais não funcionam como vetores que transformam indivíduos comuns em winners, como na sociedade norte-americana”. (BARBOSA, 1999, apud FONSECA, 2007, p. 15). Outro aspecto observado é que ainda que seja característica de sociedades coletivistas (conceito de “famílias alargadas”) a política de desenvolver e dar oportunidades aos filhos dos empregados mais antigos da casa, esta prática não foi observada em nenhuma das empresas estudadas. Na Empresa B foi mencionada a transferência de responsabilidades, que em certa medida associa-se ao, “medo de errar”, traço que em sociedades coletivistas pressupõe-se que estes não sejam cometidos sozinho. Nas culturas coletivistas, as relações profissionais se misturam com as pessoais, tornando-se parte do círculo de amizades e os erros são então mais tolerados. Conforme Fonseca (2007), a suposição é de que grupos são mais seguros do que indivíduos, sendo inapropriado responsabilizar um indivíduo por falha em sua performance, já que o destino, ao invés da competência, determina os resultados. Por outro lado, a política de Recursos Humanos tem buscado encarar o erro como salutar, talvez por entender que isto possa encorajar as pessoas a assumir riscos, mas por outro lado, conforme apregoa Tanure e Prates (1996) pode gerar impunidade, tendendo a gerar um clima de baixa motivação e de grande permissividade nas organizações. De fato, as áreas executoras se posicionam no sentido de que estas situações deveriam ser passíveis de punição, já que queixas e conflitos são gerados. Face ao exposto, este traço parece não estar sendo bem manejado pela liderança, no sentido de promover estímulos para o aperfeiçoamento e a busca da auto-superação, já que o responsável pelo controle de gestão entende que há um problema na contratação e o princípio deve ser de que “quem faz, tem que acertar”, o que possivelmente realimenta o sistema, enfatizando o “medo de errar”. O entrevistado da Empresa A entende que, do ponto de vista da organização, destacam-se como valores percebidos de seus funcionários, a preocupação com a remuneração, desafios, reconhecimento e promoção - nítida a preponderância de valores “masculinos”, associados à ascensão de carreira e performance. Por outro lado, também foi identificada uma baixa realização profissional, captadas nas pesquisas de clima organizacional: um sentimento de que capacidades profissionais estão subutilizadas, tendendo a uma concentração de tarefas. Correlaciona-se a este aspecto, o fato de que a segurança de emprego (característica feminina) também tenha sido destacada, o que sugere que por receio de perder o emprego, os funcionários, limitados nas próprias tarefas, centralizam-nas como meio de proteção. Ainda assim, observa-se uma contradição entre o que a própria organização entende que sejam os valores dos funcionários com o seu posicionamento em relação ao que é esperado dos mesmos. A organização espera que os executivos devem ter menos interesse de serem reconhecidos como grandes líderes; tendendo a envolver os grupos nos processos decisórios e foco em qualidade de vida, características tipicamente femininas. Neste quesito, para a Empresa B, foram destacados os valores de segurança de emprego e ter boas relações de trabalho com a chefia direta (hierarquia) – aspectos femininos. No entanto, a remuneração (cultura masculina) revelou-se o traço mais importante para ambas as empresas. Conforme preconiza Tanure (2005), tende a crescer na sociedade brasileira as características consideradas masculinas, como o interesse pelo sucesso material, em comparação com as mais femininas, como ternura, generosidade e cooperação. O entrevistado da Empresa B declarou que a posição dos funcionários é de evitar os conflitos. Este aspecto tem provocado divergências nas posições de Recursos Humanos, que estimula os comportamentos não agressivos e o consenso, que conforme Trompenaars (1994) é característico de culturas orientadas externamente, que estimulam a harmonia com outras pessoas e com o ambiente. Já as áreas executoras, preferem posições mais assertivas – características de culturas orientadas internamente, onde a crença é que os indivíduos podem ser perfeitamente modelados, assim como o ambiente. A posição do Recursos Humanos vai de encontro às conclusões das pesquisas de Tanure e Prates (1996), que consideram que o traço de evitar conflitos estimula a criatividade na busca de soluções, sendo necessário estabelecer uma “rede de amigos”, se diferenciando pela hierarquia e pelas relações pessoais, nas quais os indivíduos encontram seus sistemas de suporte, conectando-se com o ambiente externo e enfrentando a impessoalidade da burocracia, das leis e das instituições. Já na Empresa A, verifica-se uma tentativa de resolver os conflitos abertamente, através da prática de reuniões semanais onde todos os funcionários são convidados a participar e expor os problemas ocorridos. Não sendo este o objetivo da pesquisa, não foi possível avaliar a eficácia deste procedimento, ainda quando se considera que a atitude esperada é de evitar conflito, elemento de nossa cultura. Contudo, verifica-se uma atitude pró-ativa da organização atuando neste sentido. Uma questão dual identificada nas duas empres as refere-se à importância dada aos resultados que é uma característica de culturas masculinas, onde há uma grande preocupação com performance, estimulando portanto a competição. As políticas de Recursos Humanos, no entanto, defendem uma relação mais amistosa, qualidade de vida no trabalho, chefes modestos (típicas de uma cultura feminina), o que conflita, em alguns aspectos, com a ênfase nos resultados. O entrevistado da Empresa B declarou que face à esta ambigüidade, o Recursos Humanos deixou de criticar este posicionamento por estar em contradição com o apregoado pelo comitê diretivo. Na Empresa A, foram observados alguns traços de alto grau de controle da incerteza, conforme definiu a pesquisa de Hofstede. As evidências obtidas referem-se à declaração de que os funcionários se sentem mais confortáveis com a utilização de normas, cobrando da organização quando algum procedimento não está formalizado. A empresa em certo sentido, responde à esta necessidade, quando define aos funcionários qual é a sua alçada de responsabilidades, devendo transpor à níveis mais elevados, situações nas quais estes não possam responder. Tal prática define preceitos de uma cultura específica, que conforme Trompenaars (1994), as instruções de trabalho devem ser claras, precisas e detalhadas, garantindo a melhor concordância ou permitindo aos empregados discordar em termos claros. Quanto a este aspecto, o entrevistado da Empresa B declarou que até o advento da Lei Sarbanes Oxley, os funcionários não estavam habituados a trabalhar com normas, fato que conferiu um trabalho pesado para adequação dos requisitos da lei. Conforme Bethlem (1999), a transferência de práticas de um contexto informal para um formal, gera um sentimento de que as exigências são supérfluas e é irritante o trabalho de formalização. Este aspecto retrata um ambiente de baixo controle da incerteza. Porém, o entrevistado da Empresa B, ao ordenar prioritariamente o desejo de estabilidade no emprego como valor de seus funcionários, enseja um alto grau de controle da incerteza. Mais uma vez, ao mencionar a dificuldade em executar cronogramas de atividades, revela-se também um aspecto de uma cultura sincrônica, que conforme define Trompenaars (1994) são culturas que não se subordinam a cronogramas, de forma que os compromissos são sujeitos ao tempo dedicado a outros assuntos significativos, subordinado às relações pessoais (o que também poderia caracterizar uma baixa necessidade de controlar incertezas). Ainda que “cronometrar” o tempo e as atividades, possa a princípio ensejar uma prática e não um valor, de fato, a adoção de cronogramas segue o padrão das culturas seqüenciais (como exemplo, a americana), na qual “tempo é dinheiro”, a ênfase é quantitativa e o tempo é um recurso escasso para o qual deve ser encontrada uma alocação ótima. (FONSECA, 2007). Neste sentido, o entrevistado da Empresa A, não enfatizou este aspecto, relacionando a adoção de cronogramas às atividades de manutenção, sem fazer menção às atividades administrativas. Sem denotar rigidez, declarou que os objetivos e metas definidos pela organização são cumpridos dentro do prazo esperado. Ambos os entrevistados foram categóricos ao mencionar como características positivas de seus funcionários a questão da criatividade, da versatilidade e o famoso “jeitinho brasileiro”, do ponto de vista da flexibilidade para encontrar um recurso, um caminho para enfrentar as adversidades. Mais especificamente, a Empresa B estimula a criatividade de seus funcionários ao desenvolver programas de incentivos – Projeto Estrelas - premiando aqueles funcionários que apresentem algum resultado alcançado que tenha gerado algum tipo de inovação ou melhoria de processo. Este tipo de incentivo tende a contrabalancear outra característica citada pela empresa de que os funcionários, ainda que sejam criativos, possuem baixa capacidade de realização - considerado o lado “sombra” de Tanure e Duarte (2006) – sendo necessário um “empurrão” para executá-los. Sobre este aspecto, Tanure e Prates (1996) mencionam que está presente o traço do espectador, onde é comum observar pessoas com idéias inovadoras, mas que se não houver uma recomendação explícita do chefe para desenvolver o projeto, as idéias ficam apenas como idéias. Ainda segundo Bethlem (1999), revela-se aí também um traço de uma sociedade de fraco controle da incerteza, onde as pessoas não se sentem perturbadas por comportamentos ou idéias “diferentes” e são mais tolerantes, tendendo a produzir mais inovação. Contudo, isso não implica necessariamente que são mais atuantes em inovar. O “jeitinho brasileiro”, também apontado pelas empresas, reflete uma característica da dimensão coletivista encontrada na nossa sociedade, onde as pessoas nascem dentro de grupos que podem ser uma extensão de sua família. O comportamento esperado é de que cada um olhe pelo interesse de seu grupo e este fiscalizará e o protegerá, sendo essa uma forma de forte integração e de impermeabilidade de algumas sociedades. Foram enfatizadas pelo entrevistado da Empresa A, características positivas como capacidade de liderança, trabalho em equipe e a busca pela coesão organizacional (sendo
as duas últimas bastante correlacionadas ao coletivismo) e ainda foi ressaltado o
compromisso com a tarefa. Contraditoriamente, o entrevistado da Empresa B, mencionou
que os funcionários tendem a privilegiar as relações pessoais em detrimento do profissional.
O posicionamento da Empresa B parece estar mais em linha com o previsto na literatura, na
qual em sociedades coletivistas, o “pessoal prevalece sobre a tarefa”.

Variáveis

Empresa A
Empresa B
Relacionamento
• relação “mista” entre superiores • relação “autoritária” entre Hierárquico
• processo decisório • processo decisório centralizado Gestão das • paternalismo/patriarcalismo
• não há estabelecimento formal • definição de objetivos conjunta • presença parcial de feedback´s Perfil dos • valores “masculinos”
funcionários
“femininos”) – perspectiva da • valores mistos (“masculinos” e organização • ambigüidade (enfoque nos • postura de evitar conflitos resultados versus qualidade de • ambigüidade (enfoque nos vida) resultados vs. qualidade de vida) Controle da • baixo turn over
incerteza
Elementos da • criatividade
cultura brasileira
• capacidade de trabalho em • baixa capacidade de realização Quadro 3: Análise dos Resultados: variáveis relacionadas aos elementos culturais
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo baseou-se na corrente de pesquisa difundida à partir da década de setenta, na qual foi enfatizada a diversidade dos estilos de gestão, em função da influência das diferentes culturas locais (cultura nacional) marcadas pelas características de determinado país/região. A assim chamada “corrente divergente”, propôs-se a analisar o impacto dessas diferenças sobre os estilos de liderança, processos de negociação, gestão de pessoas, motivação e gestão de conflitos sob a premissa de que condições particulares, de maneira geral, demandam soluções específicas, que podem se tornar inadequadas se aplicadas em outros contextos. Portanto, a cultura nacional configura-se como fator importante na administração das empresas. Neste contexto, a pesquisa teve como objetivo identificar se as características da cultura nacional são consideradas (em qual medida e em quais aspectos) no desenho dos sistemas de controle de gestão das empresas estrangeiras conforme apregoa a corrente divergente. Para tal, foi escolhido o método de estudo de caso aplicado em empresas estrangeiras instaladas na cidade do Rio de Janeiro, a partir de entrevistas direcionadas aos respectivos responsáveis pelo controle de gestão destas empresas. Tratando-se de um estudo de caso, deve-se em levar em conta que os resultados apresentados não podem ser generalizados. Da mesma forma, optou-se por entrevistar os responsáveis pelo controle de gestão das empresas, no intuito de identificar quais são as suas percepções e como são conduzidas as questões relacionadas à gestão, objeto da pesquisa. É de se esperar algum viés nas respostas, face ao próprio objeto da pesquisa que se relaciona à aspectos culturais, que por conseqüência, correlaciona, sobretudo, à questões de valores. Neste sentido, pode haver uma tendência dos respondentes a omitirem algum fato ou procedimento, que porventura, consideram como um “valor negativo”, ainda que tenha sido frisado, o fato de que, sendo a cultura (nacional) “a programação coletiva da mente que distingue os membros de um grupo ou categoria de pessoas face à outro” (HOFSTEDE, 1997), seria esperado que conceitos, concepções e valores diferentes fossem encontrados como resultado da pesquisa. Para tal, buscou-se identificar aspectos importantes, através de perguntas “sintomáticas” que indiretamente levariam à observação dos pontos contemplados nas variáveis de pesquisa. Com base na análise dos resultados, algumas conclusões são comentadas a seguir: • Não foi verificada uma unidade em termos da classificação dada por Hofstede (considerando-se suas dimensões), dentro das empresas e entre as empresas pesquisadas. Ou seja, foram identificados aspectos que remetem para um grande IDH, assim como foram identificados outros que consubstanciam um baixo IDH, e assim para as demais dimensões. • Em ambas as empresas confirmaram-se traços de grande distância hierárquica, conforme as descrições contidas no estudo de Hofstede: nos processos decisórios (“a decisão final é do chefe”) e na definição dos objetivos dos funcionários (Empresa A); no processo de formulação de estratégias, na elaboração do orçamento e no estilo de relacionamento observado entre lideranças e subordinados (Empresa B). Mas nota-se, que em alguns aspectos há uma tentativa de aproximação entre as lideranças e subordinados mediante práticas de uma maior interação entre as partes, como ocorre no processo de comunicação dos objetivos. • Foi possível identificar uma predominância de aspectos típicos de culturas coletivistas como “medo de errar – errar sozinho”, postura de espectador, transferência de responsabilidade, preservação da harmonia, “evitar conflitos”, “perda da face”, “jeitinho”. Neste sentido, as duas empresas - em especial a Empresa A – adotam políticas que correspondem às expectativas em termos do que a empresa pode oferecer ao empregado, acentuando-se a dependência relativamente à empresa. Reforça-se, portanto, as características do paternalismo, patriarcalismo e “preservação da harmonia” presentes na cultura brasileira. • Entretanto, ambas as empresas adotam práticas de gestão desenvolvidas em culturas individualistas (HOFSTEDE, 1997) e voltadas para a conquista (TROMPENAARS, 1994) como a adoção de orçamentos, avaliação de desempenho com a concessão de incentivos financeiros, critérios de promoção baseados na meritocracia. Práticas estas que exigem características não comumente presentes na cultura brasileira (alto poder de negociação, performance, baixa fuga à incerteza). Conforme Fonseca (2007), as práticas gerenciais carregam valores dos pesquisadores que as desenvolveram, escondendo valores próprios da ideologia capitalista, os quais confundem-se muitas vezes com valores da sociedade norteamericana. Complementarmente, Bethlem (1999) afirma que a transferência de habilidade de management dos países mais desenvolvidos para os menos desenvolvidos sempre terão que vencer uma grande diferença em individualismo quando a transferência é de um contexto cultural individualista para um coletivista, reforçando o argumento. • A importância dada à remuneração – característica crucial das culturas masculinas – figuraram como principal valor dos funcionários das duas organizações, seguidos pela preocupação com a performance. No entanto, valores femininos também se mesclam aos citados, como a segurança de emprego (que pode também associar-se à grande fuga à incerteza) e a necessidade de manter boas relações com a chefia. Ao passo que, no que tange aos valores da organização, parece haver um conflito entre as posições defendidas pela gestão de recursos humanos, que expressa uma preocupação com a qualidade de vida e defende posições mais amistosas e consensuais (cultura feminina) e o corpo diretivo que enfatiza os resultados (cultura masculina). • Traços de alta fuga à incerteza foram observados nas duas empresas pesquisadas (necessidades de normas – para a Empresa A, medo de perder os empregos, centralização de tarefas); mas em contrapartida traços de baixo controle da incerteza também foram observados (resistência à utilização de normas – Empresa B, baixa capacidade de utilização de cronogramas, flexibilidade). Algumas ações (ou convicções), do lado da gestão, podem estar contribuindo para atenuar o alto ICI, como deixar claro quais são as atribuições e o nível de responsabilidades de cada funcionário (o que pode também reforçar o traço da baixa iniciativa, se mal manejado pelas lideranças) e a baixa incidência de demissões. • Traços como a criatividade, a flexibilidade, o “jeitinho” foram citados como características dos funcionários, em concordância ao descrito na literatura. O “lado sombra” (baixa capacidade de realização, medo de errar, “evitar conflito” e peso dado às relações pessoais) também foi mencionado. Notam-se algumas ações pró-ativas nestas empresas, vislumbrando estimular a criatividade de seus funcionários através de incentivos financeiros (“Projeto Estrelas” – Empresa B) e corretivas (reuniões semanais para soluções de conflitos – Empresa A), como exemplos que puderam ser identificados no momento da entrevista. Sugere-se que este estudo seja ampliado para demais empresas de capital estrangeiro, com o emprego de metodologia semelhante de maneira tal que seja possível gerar comparações entre elas. Da mesma forma, sugere-se a extensão da pesquisa em empresas brasileiras, o que permitirá averiguar se ocorrem e em qual medida a transferência de práticas de gestão que contemplam valores de culturas diferentes da cultura brasileira. Por último, propõe-se ainda um estudo com objetivos semelhantes, mas com o emprego de metodologias que permitam uma maior interação do pesquisador com o objeto
de pesquisa (por exemplo, uma metodologia do tipo “inquirição participante”), onde os
participantes desse tipo de estudo possam ser envolvidos de uma forma mais completa e
ativa, através de um tipo de convivência conjunta que permita perceber os reais valores,
práticas e rituais da cultura organizacional e os aspectos da cultura nacional presentes.
Neste sentido, pretende-se avaliar se as práticas de gestão – observadas com maior
proximidade - confirmam (ou não) aquelas presentes no discurso.

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